sexta-feira, 13 de maio de 2011

Janela grande

A casa era grande e ficava bem no centro da cidade. Éramos três, mais pai e mãe. Cada um tinha suas tarefas diárias. O pai levantava cedo e já ia para o sítio. A mãe também acordava quando os primeiros raios de sol davam luz ao céu da cidade, deixava o café pronto, fazia a marmita do dia e também ia para a roça empelotar as mudas de eucalipto. Eu era a mais velha das três. E a responsabilidade de levar na escola, dar comida e carinho era minha. Freqüentávamos a escola durante a manhã e à tarde cuidávamos da casa. Dividíamos as tarefas. Uma lavava a louça, outra passava o pano pela casa, enquanto a outra dava um jeito no banheiro.
Cada dia uma executava uma tarefa, mas a minha preferida era passar e deslizar o pano pela sala. Era como uma valsa. Quando chegava a hora de encerar o chão daquela sala, ele passava pelo centro. Eu o esperava naquela janela grande que dava para rua. Nela cabiam as minhas fantasias, o meu amor. Trocávamos olhares e sorrisos. Todo dia era isso. E eu, com meus doze anos, vivia o meu sonho naquela sala, deslizando pelo chão de madeira em um ritmo próprio de felicidade. As menores não conseguiam entender o porquê de eu sempre querer passar o pano no chão. Elas sempre me enchiam de perguntas, e, no meu interior, o segredo em silêncio fazia cócegas em mim.
Após as tarefas de casa, era hora de fazer as da escola. Tentava ajudar as minhas irmãs enquanto fazia as minhas lições. Depois disso, brincávamos. Bonecas de pano e sonhos se misturavam. Risos, abraços e muito carinho, para nós o mais importante e fascinante de nossa infância. Mas também queríamos crescer logo e também construir as nossas famílias.
Os pais chegavam tarde, na hora em que a Ave Maria e o sino começavam a cantar na torre da igreja. Quando eles chegavam, cansados, davam um abraço cheio de carinho e suor em cada filha. Aquele cheiro e o melado dos corpos representavam para nós o significado de família. O jantar ficava pronto enquanto eles ainda tomavam banho. Sentávamos todos à mesa para comer e vivenciar os raros e inesquecíveis momentos em família.
Nós três crescemos. E eu me casei com aquele amor e construi a minha família. As meninas já estavam grandes quando isso aconteceu. Mãe e avó, filha e mãe: a barriga da mãe já tinha alguns meses de gestação quando a minha começou a crescer.

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